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28/02/2014

A fraca nobreza do inconstante

Incontrolável.
Incerto.
Imprestável!
Indesejável.
Inebriante...
Imperceptível.
Incomensurável!
Impecável!
Inverosímil?
Inseguro.
Interessante.
Imperturbável.
Indivisível.
Imundo...
Impostor!
Imponente.
Inepto.
Imaturo.
Incoerente...
Inadvertido.
Impróprio.
Intempestivo!
Imolado.
Imaterial.
Imenso.
Intenso.
Inócuo.
Imperativo!
Inteligente.
Imaginário...
Insano. 


Infeliz.






Os Portugueses

Homens da terra,
da luta no peito,
do dia à dia do pão!
Homens do suor feito nos ossos,
de um corpo quebrado,
desconjuntado mas refeito!
Tu que caminhas a pé
para não deixar que nada falta,
a quem não permites que nada mingue!
Tu que pegas na marreta;
a parca extensão das tuas mãos em calos unas,
erguendo os braços injustiçados a cada golpe!
Não te abandonem as forças mesmo que não as possuas mais,

rasga um grito ao Céu chamando-lhe teu!
Não recuas;
não te negas,
não recusas,
não te partes em dois,
não te vergas nunca mais!
Chacinas as costas com a canga da exploração,
com o demo do desemprego a pairar nelas!
Suplantas-te e agarras o sofrimento,
emigras e levas as rezas dos que amas contigo!
Atiras o tijolo mais alto que os demais,
acartas as sacas de areias
com suores de sangue sem queixumes;
deitas-te morto e vivo acordas para mais uma jorna,
vais ao campo e passeias as bestas!
Todos os dias tu lutas.
Nos transportes fazes na mente
a poupança das ninharias,
meditas e recais no que falta a pagar,
mastigas o almoço de sobras,
sorves a bica com vício e pensas, sentes e dizes:
 -“Como seria bom que aqueles senhores de políticas e leis,
esse filhos da outra; 

vestissem a minha camisa,
as minhas calças e botas gastas e nas mãos polidas,
lhes passasse a morar uma enxada!”
Rouba-se neste país à luz do dia,
despem-se as pessoas dos seus direitos,
oprime-se e omite-se,
invoca-se o deus profano da economia,
entrega-se o reino a reis pagãos arianos! 

Aqui se mente com a facilidade das palavras empoleiradas em discursos!
 

Que futuro pensas tu e eu!?
Não tenho respostas.










Impulso

De um suplício desnudado,
de sombras e entre luz banhado;
solta-se, liberta-se,
desprende-se um só beijo abastado,
firme, carnudo, dado a tudo e desatado,
imponente e suspirado,
afirmado e vigente,
ínclito e atrapalhado.

Somos dois que num se ficam.




27/02/2014

Recordação

Trago comigo apertada em recado,
a lembrança doutros tempos
onde tudo era melhor e não sabia eu.
Essa memória é um quadro que eu penduro
na parede reconhecida do meu olhar.
Vejo-o em melancolia e desejos de esperança doce.
Essa recordação é o piano onde toco;
uma canção da loucura nascida de mim.

Trago comigo a história de tudo o que tive e a que não dei
o valor devido.

Essa chaga rude é só minha de ter.
Uma tristeza crua é agora o meu sustento e modo de viver.






 





26/02/2014

Meu menino

Vestido de trapos velhos passeias tu.
Vestido de panos cruzados e no entanto sempre nu.  
Um menino das ruas coberto em faixas de amargura.  
Por entre os encontrões e tropeções sobrevives;
pelo meio dos que por ti passeiam indiferentes,   
vives.  
Acordas a Céu aberto.
Adormeces num jardim deserto.  
Nesses teus olhos que já todos os dias choram,
lutas contra os que te pisam e ignoram.
 
Má vida levas tu,   
mão estendida e sem a esmola, nua e vazia.  
A tua expressão é sem sombra de uma infância vivida.

Ao frio e gelo sonhas e a tua coberta
é a noite com a madrugada de mão dada.  
Não tens nada nem ninguém a quem chamar teu.  
Apenas Deus te guarda como seu.  
Pobre nasceste de tua mãe pobre também;
ninguém ao teu encontro vem, nada te detém.  
Quando te empurram e cais quem te enxuga as lágrimas?  
Quem te pergunta para onde vais?

Sentas-te cansado na calçada.  
Ameaçam-te à pedrada de emboscada!  
Há uma voz que se interpõe.  
De falas mansas mas autoritárias,
o seu ordenar de lei se impõe.
Tens o carinho de uma mão doce, pesada e uma luz brilha no teu olhar.
Miras-lhe o rosto;
o cabelo longo e negro,
pele amorenada como a tua, cor de Sol de Agosto.
Brincas com os dedos de umas mãos com chagas secas sem sinal posto.
Tomas-te como seguro.
Aquele homem calou a multidão num sussurro.

Beijas-Lhe a face com carinho.
Chora Ele lágrimas de mansinho que lhe humedecem o rosto.
Fechas os olhos,
dormes rendido por um instante.
Quando acordas,
dás conta que partiu sem o vires.

Meu menino,
és tu como Jesus.









Meias mentiras

Diz-me que hoje só nós dois importamos.
Que neste dia não importa nada mais para além destas paredes! 
Hoje não temos de olhar para lá fora e ver o Mundo que encerra tanto de mau!

Conta-me que não tenho que penar por aqueles que perdi.
Diz-me que não tenho de lidar
com os choros dos que não sobreviveram ou com as lágrimas de sangue,
daqueles que viveram e se questionam porque que vivem eles!

Basta-me que digas que és tu a minha felicidade tornada toque quente!
Recorda-me que eu não tenho de dar importância aos que demonstram 

estupidez e insensibilidade.
Assombra-me,
sussurra-me que eu não tenho de me esconder;
de me sentir inseguro, incerto e vulnerável!
Ensina-ma que posso amar e ser livre de o fazer!

Diz...
Ou diz-me só o quanto tu me amas porque eu sei,
que tudo o resto são espinhos num rosário
de ilusões meias ditas, 

meias sentidas.








25/02/2014

Numa mão de areia

Trazes uma euforia misturada ao sabor do teu suor.
Sinto-o nos lábios.
É salgado e doce ao mesmo instante.
Arqueio os braços,
dou-te uma morada neles.
Surpreende-me o teu sorriso impaciente, 
o teu modo de me teres à mão.
Reportas-me a tua solidão;
as noites que trazes nas tuas lágrimas pias,
fazem-me desejar que seja sempre dia.
És a minha maior ambição, o meu segredo constante.

Não és feliz ou infeliz.
Encontras-te como eu, 
partida ao meio sem forma direita de se colar.
Temos vidas a momentos.
Irrecuperáveis...
Não temos vidas inteiras;
somos restos de rochas e areias pisadas.
Corre-nos nas veias a loucura 
de sentirmos que estamos perto, 
estando longe!
Não somos certos, limitados e convencionais.
Temos horizontes e pontos de ampliação diversos;
somos tão certamente anormais.


Mas lá paras o Vento.
Acorrentas o tempo.
Embrulhas um sorriso desperto na tua boca.
Chegas e acordas a minha.
Calas-me já que nada mais há para dizer.
Estamos aqui.